A Primeira Profecia tem dividido opiniões desde sua estreia. Para alguns, é um retorno honesto ao terror clássico com doses de crítica social. Para outros, não passa de mais uma tentativa reciclada de franquia que já teve seus dias de glória. Mas uma coisa é certa: o filme não é raso. Ele tem camadas, provoca reflexões e deixa o desconforto que todo bom terror deveria deixar.

Então, afinal, A Primeira Profecia é um terror inteligente ou só mais do mesmo? A resposta está nos detalhes — e eles dizem que o filme tenta, sim, sair do óbvio. Consegue sempre? Não. Mas há escolhas ousadas, estética bem construída e uma proposta que vai além de sustos fáceis.

O que é A Primeira Profecia, afinal?

O filme se propõe a contar o que veio antes do clássico de 1976, “A Profecia”. A proposta é mostrar a origem do Anticristo a partir da perspectiva de uma jovem noviça chamada Margaret, que chega a Roma para servir à Igreja e acaba descobrindo conspirações aterrorizantes. A trama mistura religião, política, poder e o papel da mulher em instituições historicamente masculinas.

A ambientação é sombria, como pede o gênero, mas o ponto central do filme é a tensão crescente. Não há sustos gratuitos a cada cena. O terror é construído na atmosfera, no incômodo, nos silêncios que precedem o caos. E isso já o diferencia de muitos longas atuais.

É só mais um filme de possessão?

Felizmente, não. Apesar de usar alguns elementos familiares — padres, conventos, símbolos religiosos — A Primeira Profecia tenta subverter a estrutura tradicional. O foco não está em rituais de exorcismo, mas nas engrenagens por trás da criação de uma figura do mal.

E o que dá força à narrativa é justamente isso: o mal aqui não é sobrenatural apenas. Ele é institucional. Ele está onde ninguém ousa questionar. Isso torna o filme mais provocativo do que a média e entrega uma crítica disfarçada de suspense.

Vale pelos sustos ou pela história?

Pela história. Se você procura sustos a cada cinco minutos, talvez vá sair decepcionado. Mas se gosta de narrativas que incomodam devagar e entregam tensão bem construída, esse filme pode surpreender.

A Primeira Profecia investe mais no desconforto psicológico do que no susto visual. É como se quisesse que o espectador pensasse mais do que pulasse da cadeira. E isso pode agradar quem procura terror com conteúdo.

Além disso, a direção tem sensibilidade para sugerir, não apenas mostrar. Muitas cenas são simbólicas e jogam com o que não está em tela, mas é sentido — e isso é um mérito.

Atuações que seguram o filme

A protagonista Margaret é vivida por Nell Tiger Free, que entrega uma performance densa e envolvente. Ela consegue transmitir, com olhar e silêncio, todo o conflito interno da personagem. É ela quem carrega o filme nas costas e convence o público de que a ameaça é real, mesmo quando nada de “grande” acontece.

O restante do elenco está bem, mas é ela quem imprime autenticidade e peso emocional. Sua transformação ao longo do filme é o que dá profundidade à trama.

O que o filme acerta em cheio?

1# Atmosfera – O design de produção é impecável. Os ambientes, a trilha sonora e a iluminação criam um clima angustiante que não precisa gritar para ser notado.

2# Crítica sutil – O filme insinua mais do que afirma, mas deixa claro que o mal pode estar disfarçado de fé, autoridade e tradição. Isso dá um peso extra à história.

3# Evolução lenta, mas firme – A narrativa se desenvolve sem pressa, mas cada cena tem propósito. Nada é aleatório ou apenas estético.

E o que deixa a desejar?

Apesar dos acertos, A Primeira Profecia escorrega em alguns momentos. O terceiro ato, por exemplo, tenta ser grandioso demais e acaba quebrando um pouco o ritmo sombrio e psicológico que vinha sendo construído.

Algumas cenas parecem querer explicar demais, perdendo a sutileza que dominava os primeiros dois terços do filme. E, como prequel, há momentos em que o roteiro força conexões com o original de 1976, o que pode soar gratuito para quem não viu o clássico.

É necessário ter assistido A Profecia original?

Ajuda, mas não é obrigatório. O filme funciona sozinho e entrega a própria narrativa com começo, meio e fim. Mas quem conhece o universo da franquia vai identificar referências, nomes, frases e conexões que enriquecem a experiência.

Aliás, o uso da nostalgia é pontual e bem feito — diferente de outros filmes que se apoiam totalmente na fama do passado. Aqui, o passado é ponte, não muleta.

Então… é terror inteligente?

É sim — dentro do que se propõe. A Primeira Profecia não reinventa o gênero, mas também não cai nos clichês mais óbvios. É um terror mais reflexivo, que provoca incômodo silencioso e tenta dizer algo por trás das imagens.

Não é perfeito. Não vai agradar quem busca adrenalina a cada cena. Mas para quem valoriza atmosfera, construção narrativa e personagens que não são rasos, ele entrega mais do que se espera.

O público está pronto para esse tipo de terror?

Nem sempre. Muita gente vai sair da sala dizendo que “não aconteceu nada”. Porque esse tipo de terror exige atenção, exige pausa, exige uma escuta mais profunda. E nem todo mundo está disposto a mergulhar assim.

Mas talvez esse seja o papel do bom cinema: não entregar respostas prontas, mas deixar perguntas abertas. E nesse ponto, A Primeira Profecia acerta. Ela planta incômodo. E onde há incômodo, pode nascer reflexão.

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16 de maio de 2025